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completos extremos

Mas deixa estar. É o que repito para mim mesma enquanto olho a chuva, pela milhonésima vez, daquela antiga janela. Como eu odeio a sua falta de visão. As suas palavras que soam tão didáticas e logo se dissolvem no ar para sobrar apenas aquela sombra de carinho, de amor, de saudade. É só uma sombra. Porque sua capacidade de demonstração não vai além disso, você só reflete mas não me mostra a luz. Você é tão pequeno na sua amargura. Tão esmagável. E é exatamente isto que faço: esmago lentamente tudo que você diz. Pois se não esmagasse eu teria de acreditar, e acreditando, quem acabaria esmagada seria eu.
Porque você, nem ninguém, entendem que eu quero mais, preciso de mais? Me oferecem migalhas e querem que eu as coma contente e agradeça. Minha analista diz que eu exigo de mais de tudo. Não. Eu só não quero restos, porque sou inteira, me dou inteira a todos que amo, não mereço a reciprocidade exata? Nada mais justo, não é? Parece que não. Parece que temos de nos contentar com toda essa falta, ou devemos aprender a também nos faltarmos. 
O negócio é que eu nunca soube ser aos pedaços, me doar aos pedaços, sentir pela metade. Me entrego totalmente, bebo tudo até a última gota, faço tudo que posso. Daí choro, esperneio, grito, sofro, morro. Pra depois renascer assim, meio torta, desajeitada, e faltando uma parte. Enquanto vocês só doam uma parte para continuarem completos, eu me dou inteira pra depois ficar em pedacinhos.
Não me venham com isso-é-questão-de-tempo. Já passou-se um tempo, não aprendi. Não é algo a se aprender, sou assim, morrerei assim e não há o que se possa fazer. Para mim é oito ou oitenta, frio ou quente, tudo que é morno me faz mal, tudo que é sem ser, tudo que ameaça e não vai. Preciso de alguém que seja assim também. E meu bem, um segredo: não é você.

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sobre agradecimento e cegueira

E depois de tantas coisas. Há ainda algo que quero lhe dizer: obrigado por não me amar. Eu sei que você irá estranhar eu lhe agradecer por isto. Mas, encarecidamente, obrigada. Obrigada por cada gesto seu que me mostrava o quanto não me amar era sua principal tarefa, por cada palavra sua que cortava fundo todas as minhas artérias e me fazia emudecer e depois chorar, chorar e chorar. Meu deus, como eu chorava.


Você não me amava de forma tão veemente que doía, cortava, dilacerava, partia. E parece que quanto mais você confirmava o seu não-amor por mim, mais eu queria o contrário, mais eu implorava, mas eu esperava que tudo mudasse de repente, uma surpresa, você aparecer na minha casa de repente e falar que era um idiota e me amava, resultado de todos os romances que assisti e li. Fiquei dias assim, dias sem escrever, sem ler, sem ouvir as minhas músicas, porque todas as coisas bonitas da vida me lembravam você e você era algo que me fatigava até a última gota de bom senso.

Eu lhe dizia tantas coisas, e tantas repetidas, que você me mandava calar, parar de ser estúpida. E eu pensava no quão estúpido era você por, apesar de tantas repetições, não perceber o perceptível. O meu apelo desesperado por amor, que estava sempre nas entrelinhas. Ler as entrelinhas, este nunca foi seu forte. E aliás, acho que nunca lerá este texto. Você nunca se interessou por nada que escrevi.

Todas as formas de mostrar a sua falta de amor estavam estampadas, mas eu não via. Estava cega. Na verdade eu via, mas não conseguia assimilar. Como era possível que pudesse viver sem mim? Não era justo. Como não lembrava de tudo assim como eu? Como não estremecia no menor indício de qualquer lembrança que remetesse a alguma coisa que algum dia foi só nossa da mesma forma que eu fazia o tempo todo? Impossível entender. E o seu silêncio era tão profundo, e, ao mesmo tempo, vazio e cheio, cheio da dor que a minha alma se preenchia.

Mas você deve estar se perguntando porque mesmo te agradeci. É só porque depois de tanto tempo, tantos choros, aflições, esperas intermináveis, eu pude ver. E vi. E olhei denovo. E mais uma vez, porque nossos olhos nos enganam e eu já estava farta de me enganar. É só porque depois de tanto lamentar a sua falta, percebi que a minha maior falta, era de mim mesma. Te amei tanto e te dei tudo que pude, e não sobrou nada para mim. O que fazer? Recuperar o tempo perdido comigo mesma. E quanto a você? Obrigada por me ensinar uma das maiores lições da minha vida. Obrigada por me fazer enxergar o óbvio: eu mesma.

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A arte de acostumar-se

Fala-se muito sobre a arte de perdoar, a de fingir que não está com ciúmes, a de dizer "tudo bem" quando nada vai bem. Mas, para mim, a arte mais relevante de todas é a de se acostumar. Se acostumar com o erro de alguém, com o ciúme que invade nosso peito e nos faz parecermos tão pequenos, se acostumar com o "não estar bem" e encará-lo.
Se nos acostumamos tudo vai, tudo se torna aceitável e o sofrimento é diminuído. É claro que continuamos a sofrer, mas um sofrimento consentido, consciente. Sempre fui péssima nessa arte e é irônico estar escrevendo sobre ela, sendo que nunca a dominei. Não sei vocês, mas eu, na menor provocação, parto para a briga, armo a banca, jogo na cara e não quero nem saber. Na menor insegurança, faço a frente, dilacero corações para que o meu não seja dilacerado primeiro (é claro que ele acaba também sendo, mas de uma forma egoísta e orgulhosa "fiz você sofrer primeiro"). Na menor ofensa, desfaço laços, me magoo fácil e não me importo em perder ninguém. Não preciso de ninguém, eles são só ingredientes a mais, é o que sempre digo.
É claro que estou errada e é claro que preciso me acostumar com as diversas situações que a vida nos coloca, as peças que ela nos prega, as facetas que precisamos desmembrar para que nos tornemos mais ávidos e sábios.
Invejo aqueles que se adaptam fácil. Adaptação. É essa a palavra chave. Fortes não são aqueles que, como eu, estão sempre prontos para atacarem o próximo e saírem por cima, estes são dos mais fracos. Fortes são os que se adaptam as situações e buscam dela o melhor possível, sem orgulho, sem necessidade de serem superiores, só querem aprender, sabem lidar com tudo.
O que posso dizer? Este texto é mais uma confissão minha, um apelo emocional para mim mesma do que qualquer outra coisa. Para vocês eu só digo: acostumem-se.

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sobre amor e renovação

O casal esperava impaciente por sua vez, a sala de espera estava lotada e a situação não era nada confortável. Ele, olhando para os sapatos bem lustrados e fingindo estar tranquilo. Ela, folhando nervosamente uma edição muito antiga de Caras e rezando para que a situação acabasse logo. Os dois casados há quase vinte anos e não conseguiam mais se olhar na cara. Porém, depois do último acontecimento resolveram apelar para a psicanálise por ser o único meio que encontraram, nada muito fora do normal, lugar-comum entre os casais de hoje em dia.Porém, nenhum dos dois colocava muita fé.
A história foi a seguinte: os dois estavam em uma relação desgastada. Ele não aguentava mais as cobranças dela, as reclamações, os suspiros nas horas em que se encontravam em casa, o modo como não conheciam mais a vida um do outro e nem sequer se envergonhavam de viver nessa rotina fajuta. Ela não suportava o quanto ele simplesmente ignorava toda a situação e agia como se nada acontecesse, como se ela fosse um objeto figurativo em sua vida. Os dois não se interessavam mais, havia algo bem mais interessante ocupando a vida de ambos, uma relação virtual.
Era nisso que ele ocupava todo o seu tempo de hora extra no escritório: teclando. E também era o que preenchia as tardes em que ela supostamente deveria estar na academia ou no shopping. Os dois esgueiravam-se pela tela e lá contavam suas vidas de forma aberta, eram pessoas novas e diferentes e libertavam-se da rotina pesada e desconfortável que viviam na vida real em seus relacionamentos.
Certo dia, o homem arrumou-se como nunca antes, usou seu melhor terno , o cabelo cortado, a barba feita, finalmente usou o perfume caro que havia ganhado no natal passado. Motivo: um suposto jantar com um futuro cliente importante. A mulher no exato dia, também estava esplêndida, optou por um vestido preto justo, pele, cabelo, rosto impecáveis, saltos altíssimos. Motivo: suposto jantar com amigas da academia. Estava claro que os dois iriam encontrar-se com seus amantes virtuais.
O homem foi. A mulher esperou por um tempo até ele estar fora de seu campo de visão e então partiu. Ao chegaram no refinado restaurante, uma surpresa: deram de cara com si mesmos.
Os dois ficaram ainda mais aborrecidos um com o outro, praguejaram, alegaram traição e saíram, cada um em seu carro, em casa não deram uma palavra. E agora ali estavam, na sala do analista, esperando por uma resposta convincente para o incidente infeliz que havia acontecido entre os dois.
Ao serem atendidos, os dois retrataram a história de forma feroz, cuspiram as palavras rapidamente antes que pudessem se arrepender de estarem ali, expondo-se a um homem que nunca haviam visto antes na vida, e sujeitos a se tornarem um episódio engraçado do mesmo em uma roda de amigos. História contada, o analista os olhou e sorriu, alegando-lhes que isso nada mais era do que um refúgio que os dois procuraram devido ao desgaste da relação, a busca por novidade. E aí falou algo engraçado que os deixou pensando por dias e os fez repensarem seu casamento e reatarem: O verdadeiro amor não acaba, só perde-se nos labirintos da falta de compreensão, no remoto, no tédio da vida a dois sem surpresas.
Os dois puderam conhecer as diferentes facetas de suas personalidades, aquelas que mantinham escondidas de si mesmos, preferindo manter a falta de humor e o comodismo. E ao se descobrirem pessoas novas tiveram uma surpresa: gostaram muito mais delas.
A história toda nos faz pensar, será que a grande chave que cessará a luta entre amor versus tempo é a novidade?

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